sábado, 10 de dezembro de 2011

Amor a primeira descarga!

          De bar em bar... Eis o meu lema de hoje vertido ao sempre.
          A coragem que dispomos é 99,9% etílica acompanhada por qualquer cigarro... Afinal, o que conta é a potente ação da nicotina na massa encefálica – ferrando conseguintemente o pulmão. Bem, não cabe agora “Dráuzio varelar”. Depois de uma longa caminhada, com aquele all star desgraçado que você comprou um número menor que seu pé, pois se deixou levar pela opinião tendenciosa e maléfica do vendedor, encontra finalmente um bar aparentemente bacana. Certo, estão tocando Paula Fernandes ou qualquer coisa que te leva a pensar: “Caralho, o que estou fazendo aqui?”, no entanto, nada é 100%. Nem mesmo a coragem embriagada.
          Mas você engole... Está aí o motivo da embriagues: Paula Fernandes, “festa estranha com gente esquisita”, excesso de conversa em que as palavras soam como zunidos, e vontade de urinar! Ah, e essa vontade que não passa! Então, desce mais uma loirita escoltada de um “bombeirinho” lindo ao lado. Que casal: A loira e o ruivo (repleto de fiapos de limão enroscando no dente). O processo do estourar bexiga não se concretiza. “Mais uma, por favor!”. E nossos queridos garçons colaboradores te entregam com uma máscara de quem chupou o limão do seu bombeirinho, enquanto os donos abrem o sorriso do Silvio Santos (o dinheiro vem aí, olê olê olá)... Mas e o xixi? “Segura aí bexiga companheira.”. Quantas rodadas passaram...
          Então, em determinado momento, Deja Vu parece Janis Joplin. Seu órgão cúmplice pedindo arrego e você negando-lhe o direito de se aliviar. “sempre cabe mais líquido... Segura a onda bexiguita.”. Mas ela está mal humorada hoje. Não há mais o que fazer... “Vou ao banheiro!”.
          “Veja só... O pessoal está a fim de encher o caneco mesmo... Olha o tamanho da fila!”. Mero engano, você acaba de se deparar com a fila do sanitário! Bexiga filha da puta! A sádica desgraçadamente resolve se vingar dos maus tratos exatamente na fila... O que fazer? Sobra cruzar as pernas fechando o canal de saída da urina. “Porque a maldita da Paula Fernandes não cala a boca?”. Seu órgão dançando sertanejo universitário (grande traidor), e ainda há cinco pessoas em sua frente, provavelmente traídos do mesmo modo que você. Daí então, o destino, mais sádico que o próprio Marquês de Sade resolve aprontar uma de suas peripécias. A pessoa da frente vira e decide iniciar um diálogo amistoso. A urina invadiu o cérebro, mas jamais passará o nível de álcool atuante no mesmo. Eis o momento: Você de repente se deixa encarnar por Clarice Lispector, e libera em frases soltas, sem conectividade nenhuma, pérolas igualmente soltas. Fala sobre a efemeridade da vida, o fragmento dos instantes, o amor pueril dos animais e até chega a recitar um trecho do poema “O corvo”, de Edgar Allan Poe. Clarice se debate no túmulo e não percebemos por conta da bebedeira.
          Duas pessoas na fila ainda! (a antepenúltima resolveu que defecaria e aumentou a agonia bêbada)... Mas, ao menos o papo continua... Nada é notado, porém inconscientemente você está flertando. Conversa desinteressada alinhando um interesse interpessoal. “Uau... Falamos sobre amor inato!”. Pronto, retomou a palavra amor e momentaneamente sente que se apaixonou. “A bexiga que se dane, prefiro urinar na calça a perder você.”. Pior do que pensava: ENLOUQUECEU DE VEZ!
 Finalmente sua vez de usar o sanitário. Segue tranqüilo, pois sabe que o alvo de sua repentina paixão também está apertado e não sairá dali enquanto não fizer o mesmo que primariamente te levou a fila.
          Entrada triunfal. “Cinto da porra!”. Abaixa desesperadamente as calças, e inicia seu trabalho de literato: Lê despretensiosamente poemas banheirísticos, números de telefones com legendas tipo “Samara travesti, pica doce de 23 cm, bumbum maravilhoso. Faço anal e um boquete inesquecível”. Sorrisinho de lado, e nojo pela quantidade de papéis dispostos no espaço do tão querido sanitário. Inicia-se a reflexão, pois parte do álcool foi embora com a descarga. “O que eu faço? Deixo passar? Acho que ficarei no banheiro para sempre!”. Mentira. Você está louca para sair e beijar deliciosa e vagarosamente. Neste vai e não vai a fila aumenta e por livre e espontânea pressão você sai. A pessoa é a próxima e te pede que espere. Não sabe ao certo por que, mas espera. Dois seres saindo pela tangente... Caminho rumo a uma casa não sua... “minha breja está acabando... Ai, não posso ficar sóbria...”, contudo fica. Caminham a sala, e sua timidez aperta. Quem diria você tímida assim! Rosto ruborizado, queimando de vergonha... Vontade de virar avestruz e esconder a cabeça em um buraco (não que eles façam isso). O desenrolar é natural e pronto: Docilidade, “timing”, e para finalizar um orgasmo exuberante. Tudo em um misto de memória olfativa e sensorial. “Nossa! Inesquecível!”.
          Ir embora é difícil, desgarrar mais ainda... A vontade de um “foda-se” para o cotidiano te invade... No entanto, vontade não concretizada...
Você volta para seu lar e uma série de enganos sucede... O desejo do “foda-se” se converte para o “me fodí”. Mas tentamos... E a última tentativa dá-se por sms, no sanitário de seu lar. “Porra... Que se foda tudo!”.
Fatídico e cabal instante: Uma grandiosa descarga e que vá tudo para o esgoto... Amores a primeira descarga são deliciosas surpresas do acaso, mas no giratório descer da água, o límpido transparece.
          Sentimento de “no rien de rien, no je ne regrette rien”.
 Resta saber que valeu enquanto submergiu.
                                
                                                                                              Beatriz Alighieri

15 comentários:

  1. A igreja dos bebados, o lugar do apaixonado embriagado de vida na morte. Genial!

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  2. o acaso e o ocaso e uma paixão!

    descarga energia -

    descarga limpeza -

    a descarga necessária:

    "Resta saber que valeu enquanto submergiu."

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  3. kkkkkkkkkkkkkkkkkk, meninaaaa, que tensão.
    KKKKK, MUITO bom! Amor a primeira descarga :S
    mariibrigadeiro.blogspot.com

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  4. Um texto sanitário, certamente. Vivas, escreva mais e parabéns pelo texto! bjs

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  5. O desejo do “foda-se” se converte para o “me fodí”. Mas tentamos...

    Nossa muito bom , engraçado, dramático e interessante de ler rs,

    Parabéns, você escreve muito bom e bem diferente.

    Voltarei aqui sempre, espero que volte amo meu blog também.

    http://rabiscoscriativos.blogspot.com/

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  6. "Amor a primeira descarga"... hauhua, genial...
    Dona Gini descobrindo novas vertentes literárias em sua alma de 220 volts. Isso ae garota, fico bem legal...

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  7. Kelen, amei o texto! Principalmente "prefiro urinar na calça a perder você"...... hahahahaha
    Você arrasa, sempre! É um deleite, uma delícia, uma gostosura ler você! Beijos com carinho da tia Rose.

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  8. kkkk Acompanhei com atenção e ansiedade a agonia da personagem de suprir as duas necessidades básicas: se encher de amor e esvaziar a bexiga....rsrsrs Também me chamou atenção o fato de não conseguir identificar se seria um homem ou uma mulher...

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  9. eu adorei ler seu texto me diverti muito... obrigado por seguir meu blog já tô seguindo o seu... bjs

    http://oblog-teen.blogspot.com/

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  10. Sempre muito criativa e espontânea, querida! ;)

    Como todos os apreciadores do companheiro e fdp, Álcool, me identifico com toda angustia, lucides, loucura latente (ao que me pareceu) desse seu 'discurso'.

    É bom ler "isso" e pensar: não sou a única que do foda-se passa ao me fodi.
    E como a 'clássica frase' de role (pelo menos entre amigos meus) : Nóis se fode, mas se diverte! :)

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  11. legal kelen como já te disse pessoalmente...fique na crônica...nessa moda...Mario Prata...verborratica na medida certa...perdida como Caio Fernando Abreu...parabéns

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  12. NOssa! ficou muito bom este texto. Ri, fiquei tenso, chorei, torci, fiquei bravo! Todas emoções desencadeadas por um xixi.rsrs. Esse texto é a prova de que tem pessoa que nasce para ser escritor. Se fosse eu este texto seria: "Estava com vontade de urinar, entrei num bar, bebi, fui ao banheiro, conheci uma pessoa, transei com ela e acordei de ressaca. FIM" Viu, não deu o mesmo efeito, por isso, PARABÉNS Kelen!

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  13. Kelen eu prefiro falar meus comentarios pessoalmente, por hora, me deterei em um parabens seu texto é lindo em varios sentidos

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  14. Quem nunca se Fu... no banheiro que atirem a primeira pedra. As pessoas cortam os pulsos no banheiro porque parece mais fácil limpar o sangue do seu desespero que vai jorrar... E nele que a bebedeira desgarrada acaba encontrando seu fim, a água fria que sai da torneira e nos obriga a pensar no depois... E se algo der errado? Como diria Raulzito: Parem o mundo que EU quero descer!

    E tudo vivido aqui neste texto é simplesmente Divino!

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  15. Olha a cara que fiz, depois que li isso...
    http://4.bp.blogspot.com/_E3accWH5QXg/TUYMIJCCkzI/AAAAAAAAFuI/CbECAeX80rU/s1600/Shaolin-morto.JPG

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